A Polêmica da Babás
Desde a questão da proibição legal
(ainda em votação) do uso de coletes pelas babás nos clubes, as opiniões se
dividem. Seria essa questão de importância menor, com a qual sequer valeria
a pena gastar o tempo e os argumentos? E antes que esse incômodo assunto fosse
devidamente esquecido, o Brasil novamente volta seus olhares à Maria Angélica,
a babá do casal de empresários que empurrava o carrinho dos bebês rumo à manifestação.
Devidamente uniformizada, já que estava em seu horário de trabalho. Devidamente
remunerada, segundo seus empregadores. Tudo dentro da lei. Trabalhista e
social.
Já que vamos discorrer aqui sobre
a legalidade do trabalho e a sociedade, recorramos à História. À época da
escravidão, era reconhecido como uma pessoa generosa e de boa moral o senhor
que tinha por ideologia não imputar aos seus escravos castigos físicos. Os
raros senhores relatados pela história que por convicção libertaram os escravos
de sua propriedade e passaram a
remunerá-los pelo seus serviços, ainda que uma remuneração simbólica, mas com a
alforria garantida, esses foram
execrados por subverter a ordem trabalhista vigente.
Abolição instaurada no mundo, sigamos
até a Revolução Industrial. Trabalhadores eram remunerados escassamente por jornadas de trabalho desumanas. Mas não
eram escravos, o que já demonstra uma evolução humanitária da relação de trabalho.
Mas a Humanidade podia ir mais longe. Criou-se
a hora de descanso remunerada.
E os direitos trabalhistas foram sendo lentamente conquistados às custas de muita luta e da vida de muitos. Menos para os trabalhadores domésticos, que seguiam em jornadas duríssimas, com a única garantia legal de receber o salário mínimo estabelecido no país. O Brasil, um dos últimos países do mundo a incluir o trabalhador doméstico na legislação trabalhista vigente, conseguiu há pouco tempo dar esse passo, a despeito dos protestos dos empregadores.
E os direitos trabalhistas foram sendo lentamente conquistados às custas de muita luta e da vida de muitos. Menos para os trabalhadores domésticos, que seguiam em jornadas duríssimas, com a única garantia legal de receber o salário mínimo estabelecido no país. O Brasil, um dos últimos países do mundo a incluir o trabalhador doméstico na legislação trabalhista vigente, conseguiu há pouco tempo dar esse passo, a despeito dos protestos dos empregadores.
Se estendermos um pouco o olhar poderemos observar que o ofício de babá e de empregada doméstica é um ofício
extinto nos países da Europa e em grande parte dos Estados Unidos. O que
demonstra claramente que ser um trabalhador doméstico não é uma opção. É a falta
dela. Onde há melhores oportunidades paga-se caro às empresas que realizam a limpeza da casa. E
remunera-se dignamente o educador infantil, já que a escola é a parceira dos
pais no horário de trabalho. Nesses países, em via de regra, cada um lava a sua
própria louça e empurra o carrinho do seu próprio filho.
Voltando para o Brasil, ainda nos
servimos da má distribuição de renda e da escassez de melhores oportunidades
para usufruirmos do trabalho doméstico. Tudo dentro da lei. Mas se já avançamos
tanto como seres humanos, acho que já não nos custa dar um passo a frente:
estabelecer a libertação do estigma social. O argumento de que o uniforme da
babá na via pública se equivale ao jaleco do médico é, no mínimo, frágil. Não sou obrigada a usar jaleco na rua. E
apesar da minha profissão me dar mais status do
que a profissão de babá, não me sentiria confortável de andar na rua e as pessoas me
olharem com uma cara de “olha, a médica!” Na rua sou pessoa. E o gari? Também não fica uniformizado na
rua? Sim. Uniforme que equivale a um equipamento de proteção. Desnecessário no
caso das babás. A babá não vai ao clube com intenção de tomar sol. Ela não vai
ao aniversário com a intenção de se confraternizar. Ela sabe do dever a ser
cumprido. Não precisa arrastar esse grilhão social. Podemos avançar como
Humanidade e libertar nossos funcionários da escravidão moral, da marca de ser
aquilo que ele não escolheu.